domingo, 11 de março de 2012

Praxe?.

Tinha acabado de entrar no navio depois de três anos de curso de máquinas na Escola Náutica. Três anos de estudo essencialmente académico e alguma, quase nada de prática oficinal.
Ou seja apareci no navio sem nunca ter posto os pés numa casa da máquina excepto uma visita de estudo ao navio S. Tomé da extinta CNN, apareci como 3º maquinista a chefiar um quarto porque a companhia entendeu que eu percebia á brava daquilo.
Os primeiros momentos na casa da máquina foram á saída do navio para viagem, só via uns gajos a andar e abrir e a fechar válvulas, ruídos fortes e parecia tudo um vendaval.
Puseram aquilo a andar enquanto eu de olhos arregalados via pela 1ª vez como se arrancava com uma máquina e não percebia nada daquilo, era tudo novo. No fim estabilizaram a instalação e mostraram-me o manómetro do óleo de lubrificação e da água de refrigeração dizendo-me: - Se isto baixar toca o alarme, desligas o motor assim e chamas-me… ok?
E assim o 2º maquinista deixou-me sozinho com um ajudante a tomar conta da instalação…
No dia seguinte a meio do quarto das 8 ás 12 chamaram-me para ver uma coisa e puseram-me numa posição estrategicamente escolhida que era debaixo de uma abertura que existe no piso das cabeças que é para pôr o embolo da maquino quando desmontado. Debaixo dessa abertura eu era um alvo fácil e foi o que aconteceu, levei uma banhada de Marine Diesel que é um combustível semelhante ao gasóleo mas é escuro como o fuel. Levei com uma “baldaça” de 10 litros de marine diesel pela cabeça abaixo, coisa que não achei piada nenhuma pois entrou-me pelos olhos adentro e cegou-me totalmente. Fartaram-se de rir á minha custa mas lá me guiaram para o lavatório para eu lavar a cara e os olhos.
Já recuperado e com os olhos a arder perguntei que depois daquela gracinha precisava de lavar o fato-macaco e onde podia faze-lo.
A resposta foi imediata:
- Entrega á lavadeira!!!!!
- Lavadeira? O navio tem lavadeira? Perguntei eu muito admirado.
- Sim, claro que tem e neste navio a lavadeira é a mulher do cozinheiro! Foi a resposta imediata.
Um navio que tinha cozinheiro, ajudante de cozinheiro, padeiro, despenseiro, três empregados de câmaras era natural que tivesse uma lavadeira também e assim lá fui eu a pingar diesel por todos os lados bater á porta do cozinheiro e entregar a uma senhora de olhos arregalados de espanto um fato-macaco encharcado em Diesel.
E fiquei á espera que me viessem entregar, esperei 3 dias até que a certa altura dando uma volta pelo navio vi uma sala com a placa de Lavandaria e lá dentro, num canto, estava o meu fato-macaco todo encharcado em Diesel e com mais uma data de lixo em cima. Abri a máquina de lavar, meti-o lá dentro e pu-lo a lavar. E ria-me da partida que me tinham feito, realmente tinha sido engraçada pois tinha sido inventada na hora, a “baldaça” não tinha achado piada mas a esta tinha-a achado genial.
E lá fui eu bater á porta do cozinheiro pedir-lhe desculpa pela minha “tenrice” pois não queria de maneira nenhuma faltar ao respeito á sua mulher que naquela altura viajava com o marido. Mais tarde soube que o homem tinha andado á minha procura para me partir a cara pois tinha ficado ofendido mas tinha sido travado pelos autores da partida.
Depois dessa passei a ter mais cuidado com o que me diziam… Esta história conto-a muitas vezes pois continuo a achá-la deliciosa… a carinha da senhora a receber o fato-macaco, a minha ingenuidade… o improviso da piada em si.
E assim me iniciei na Marinha Mercante….
Jimmy the Sailor
Publicado no SOL na terça-feira, 21 de Julho de 2009

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Uma gaivota disse: