segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Vida de marinheiro...

Toda a gente sabe que a vida de marinheiro tem umas certas rudezas. Aquela imagem antiga do marinheiro "bon vivant" com uma namorada em cada porto cada vez mais pertence a um imaginário há muito passado.
Quem quer conhecer alguma coisa desta vida tem a tendência de perguntar quanto ganhamos e quando se apercebem que temos férias de um mês e meio depois de um embarque de 3 meses aí dispara a incompreensão, somos uns sortudos.
Muito recentemente deparou-se-me essa situação e a minha singela resposta foi que ás 17 quando alguém sai do emprego vai para casa e está com a família, nós vamos para o camarote e ficamos (no meu caso) com um alarme que a qualquer hora pode tocar, estou 24 horas de atenção e disponibilidade. Quando chega aos fins de semana, um trabalhador vai para casa e descansa dois dias, nós aqui continuamos na mesma rotina.
Mas estes casos e incompreensões já são rotina, já não respondemos nem ligamos. Só que há mais... há mais situações que se nos deparam e que temos de suportar, coisa que em terra as soluções sejam mais práticas.
No fim do embarque passado tenho a infelicidade de fazer uma chamada telefónica para casa e acabei por dizer as minhas últimas palavras á minha mãe no leito da morte, faleceu no dia seguinte, só quando o navio chegou a Lisboa consegui dar um salto e visitar a sua campa.
Já neste embarque o choque foi maior, enquanto navegava para os Açores recebi a pior chamada da minha vida, tinha morrido a minha neta mais nova. Não vou aqui descrever a dor que senti e sinto, as lágrimas que chorei e choro vou antes falar na decisão que tomei. Á chegada a Ponta Delgada podia ter apanhado o avião para Lisboa mas quando lá chegasse só iria encontrar a saudade, a cerimónia do enterro já teria acontecido. Como suporte da família decidi ficar a bordo até o navio chegar a Lisboa e eu poder abraçar o meu filho e a minha nora.
Não sou nem fui o herói desta história sem heróis apenas chamo a atenção da verdadeira dor da solidão que um marinheiro pode ter.
Agora, quando navego á noite olho para as estrelas e tento ver uma estrelinha brilhante lá no alto que me indique o caminho, o caminho da paz que a minha alma necessita.